terça-feira, fevereiro 16, 2010

4.3 -Elvas Portuguesa: Os novos poderes: O Poder Espiritual



A época moderna foi decisiva para a implantação de um novo conceito de poder exercido pelas elites militares e religiosas independentemente dos poderes públicos instituídos pelo poder Central. De facto, a criação da figura do Governador da Praça Militar de Elvas e do Bispado de Elvas, determinou uma nova era nas relações institucionais e políticas com a Coroa. Ao mesmo tempo que o poder local embora autónomo dependia agora de três poderes públicos, da Coroa, do Bispado e do Militar, este último de resto não só incidia sobre o contingente militar, mas também sobre os civis que estavam sobre à sua jurisdição. A figura do alcaide, determinante na organização da vida local deixa de ter fundamento e a representação concelhia, encontra na Câmara de Elvas a sua voz ainda que abafada pelos novos poderes instalados primeiro pelo Bispado depois pelo comando militar da Praça de Elvas. O Bispado, criado pela Bula Sper Cunctas, outorgado pelo Papa Pio V, determinava uma nova circunscrição religiosa no continente português mas a única com jurisdição colonial, de facto, a realidade da Sé de Elvas era uma realidade artificial que tinha como finalidade a incorporação da diocese de Ceuta e alguns municípios que então pertenciam à diocese de Évora, como era o caso dos concelhos de Monforte e Arronches. Esta nova realidade só por si engrandeceu a nova cidade portuguesa, com uma nova elite aristocrática titulada e com uma formação académica ímpar na vida local. Na verdade o primeiro dos vinte e quatro bispos de Elvas, D. António Mendes de Carvalho era doutorado pela Universidade de Paris, considerado um homem de misericórdia, pela prestação, apoio e solidariedade aos mais pobres sendo conhecido como o “Pai dos pobres”. Foi também na sua vigência que Portugal perdeu a sua independência, tendo o Bispo inicialmente afirmado o seu patriotismo, porém acabaria por reconhecer os direitos e pretensões de Filipe II de Espanha ao trono português, mas não abandonou os que se opunham a união ibérica e nomeadamente o Alcaide Mor, António de Melo que viu a sua vida em perigo, quando as forças militares espanhóis estavam já concentradas junto do aqueduto, dos poços e de outros pontos chaves da cidade, mas foram muitas as figuras de reconhecimento que viveram no palácio episcopal da urbe elvense com a responsabilidade e fausto que tal cargo determinava. Como eram os casos dos Bispos de Elvas que desempenharam o cargo de Inquisidor Mor do Reino, como os bispos oriundos de uma das famílias de maior prestígio no Antigo Regime, os Matos e Noronha, nas pessoas de D. António (1571-1561) cuja entrada em Elvas foi notada pelo seu amplo coche forrado a veludo, puxado por quatro cavalos cujos freios estavam rematados por metais preciosos e D. Sebastião (1625-1634). D. António embora reconhecido pelo “povo” na forma como organizou o combate à peste de 1600, não era todavia popular e ficou célebre pela indiferença a que votou a D. Teodósio, Duque de Bragança não marcando a sua presença nos actos públicos e privados, a que não faltaram as autoridades locais e a fidalguia da cidade. Entre ambos, há que referir a passagem de outro inquisidor mor, D. Rodrigues da Cunha que conviveu com a classe política favorável a permanência da unidade ibérica, nomeadamente Cristóvão de Moura e o Marquês Castelo de Rodrigo, vice-rei do reino. Aliás, o último inquisidor mor do Reino, D. José Joaquim Coutinho também exerceu a sua vigência na cidade transfronteiriça nas últimas década da monarquia absoluta. Por oposição, ao Bispo do absolutismo, destacou-se D. Frei Joaquim Meneses de Ataíde, o Bispo do Liberalismo que exerceu funções entre 1820-1828, fundador da loja maçónica da Liberalidade em Elvas com o Governador da Praça em 1818, Thomas Wiliam Stubbs e que contou sempre com o apoio do seu companheiro da Ordem, Manuel da Santa Tecla outra figura do liberalismo elvense. O bispo Menezes Ataíde chegou a deputado do reino, na Câmara dos Pares e foi adversário da facção miguelista acabando por partir para Gibraltar durante o seu curto período de exílio. Outros nomes não podem ser ignorados na regência do Bispado de Elvas, D. Lourenço de Távora, oriundo da nobreza tradicional com influência na vida política nacional e indiferente à fidalguia inconformada e nacionalista, bem diferente foi D. Manuel da Cunha (1646-1667), que fora arcebispo de Lisboa e figura de destaque na época da Restauração, as suas intervenções nas Cortes foram marcadas pelo seu patriotismo e pela sua posição anti - ibérica que continuava latente em certos sectores na velha aristocracia. Não deixa de ser curioso o facto de uma parte dos Bispos de Elvas, terem no seu currículo a passagem pela Inquisição ou por dioceses coloniais como a de Pernambuco ou do Funchal, cujas rendas eram mais proveitosas para a sua dignidade, mas ao mesmo tempo a diocese de Elvas, era a mais importante na raia nacional, mesmo antes da sua extinção, o carácter administrativo, burocrático e espiritual ainda era muito representativo, de facto quando D.Frei Ângelo da Boa Morte, último Bispo de Elvas quando toma posse do Bispado conta como Dignitários recrutados no Alto Clero, o Bispo, o Chantre, o Arcediago, o Mestre Escola e o Tesoureiro Mor, o cargo de Deado estava vago. Dos treze Cónegos estavam em função onze, os Quaternários eram seis, os Beneficiados eram doze e as Capellanias eram dezasseis ou seja cerca de meia centena de clérigos constituíam o séquito do Bispado. A este grupo de clérigos juntava-se as diversas ordens religiosas num tempo em que o poder espiritual era uma das razões do prestígio alcançado por Elvas no contexto das cidades onde a defesa da soberania nacional era um ponto de honra (Continua).