quinta-feira, junho 18, 2009

A Primeira Imprensa de Elvas- 1850-1899


História Local - O desejo da criação de uma folha periódica em Elvas, desde meados do século XIX era um desejo da “elite” esclarecida desta cidade, deveras influenciada pelo desenvolvimento da mesma na Estremadura Espanhola, por isso mesmo o “arranque” da primeira folha periódica de Elvas, inicia-se com o recurso à tecnologia do país vizinho. De facto, no primeiro número da Voz do Alentejo, primeiro periódico publicado em Elvas, lê-se : “…Era uma falta, e uma falta considerável não haver em Elvas uma imprensa. Toda a gente ilustrada lamentava esta inépcia, e aspirava ao regozijo de ver estabelecida aqui uma tipografia (…). Sendo impresso no reino vizinho! Por quanto não se alcançaram os meios indispensáveis para introduzir a imprensa; convinha porém, que a todo o custo se publicasse o periódico e que, embora se faltasse a algumas causas do programa, não se faltasse a criação desta pequena folha ”.A imprensa segundo os redactores e colaboradores da década de sessenta, tinha um papel fundamental para o progresso moral e material das populações que “ela” servia, em função do debate de ideias que as folhas periódicas pretendiam promover:“… aqueles que mais favoravelmente a têm acolhido e considerado, conhecendo e aproveitando o meio que ela faculta, de comunicar as suas ideias; acelerando desta maneira a disseminação de conhecimentos; são sem dúvida os povos, que na marcha para o progresso e civilização ocupam o primeiro lugar, devendo tal supremacia ao seu desenvolvimento intelectual, que proporciona às diferentes classes a necessária inteligência para melhorar , explorar e satisfazer a todas as exigências e comodidades sociais. A ideia de que a imprensa era determinante para o progresso dos homens, tornava-se um argumento utilizado com frequência ao longo da década de 1860, no primeiro periódico de Elvas, na edição de 12 de Novembro de 1860, onde se lê:“ A imprensa periódica está considerada o principal motor da civilização do paiz; ser-lhe adverso é não querer a felicidade pátria. Verdadeiros portugueses não deixarão pois de assim pensar, e de contribuir com sua parte, para que Portugal possa um dia marchar a par dos estados cultos da Europa”. Nesta perspectiva, a defesa da imprensa para além da sua sobrevivência, propunha-se também através dos seus artigos de sensibilizar os seus leitores para a novidade e inovação que então o “mundo conhecia”, não deixando de ser ao mesmo tempo um objecto de instrução e de cultura como se lê em vários artigos publicados ao longo da época oitocentista. De um modo geral e ao longo das décadas de 1860, 1870 e 1880, o surgimento de um periódico correspondeu ao interesse de um grupo de cidadãos da terra em nome do progresso ou por razões de natureza moral e cultural:“O Elvense que nasceu, quando o paiz acordava do grande lethargo de três séculos para saudar Camões, conservou-se sempre modesto, pequeno pacífico, mesmo desejando conservar-se estranho às lutas partidárias”. Todavia esse desejo de independência dos pioneiros da imprensa elvense, foi quase sempre provisória e quase todos os periódicos que defenderam essa situação, nos seus programas, alteraram a sua intenção inicial e de um modo particular quando a questão monarquia ou república tornou-se motivo de debate na política portuguesa. Como é exemplo no artigo redactorial do Elvense após o seu XIV aniversário:“Em política tem sido abertamente monárquico, por se converter que da manutenção das instituições que nos regem resultam grandíssimas vantagens para a nação, arvorando ao mesmo tempo, com entusiasmo mas sem facciosismo a bandeira do partido progressista, por ser programa d ´este partido o mais liberal”. Porém quando se analisa as folhas periódicas ao longo da segunda metade do séc. XIX, observamos que em cada folha periódica se definia com rigor os objectivos do seu programa editorial e nessa perspectiva podemos identificar as suas intenções de forma concreta e precisa:
a) A defesa dos interesses da terra, características dos periódicos da década de sessenta.
b) A defesa de alguns assuntos de máxima importância para a província do Alentejo.
c) A defesa da instrução e da moral como elementos determinantes para que os cidadãos tivessem consciência dos seus direitos e obrigações.
d) Aceitar sem compromissos a legalidade existente como ponto de partida para um progesso, ilimitado e contínuo.
e) Moderar os impulsos da “mocidade democrática”, uma vez que as grandes conquistas são o resultado das lentas e duradouras lutas, característica presente nas reflexões das folhas republicanas.
A partir do último quarto de século de oitocentos a matriz política percorre não só os editoriais como os artigos de reflexão no interior dos semanários elvenses, as questões nacionais e locais foram motivo de debate, por vezes entre os diferentes periódicos que eram publicados, nas suas reflexões trocavam entre si de forma por vezes violenta opiniões sobre um dado momento da vida nacional. Na prática tratava-se de uma luta política entre liberais monárquicos e os defensores de uma nova ordem a República. Como se pode comprovar na seguinte reflexão:“Pretendem os monarchicos que esse poder seja perpetuo e supremo: e una querem que o monarcha governe em quanto outros só lhes consentem reinar sob a responsabilidade dos seus ministros. Pelo contrário os republicanos querem o poder maior limitado e temporário; singular conforme as affeições de muitos, collectivo segundo o desejo de muitos (…).As questões políticas locais tinham um carácter reivindicativo em torno das necessidades locais, sobretudo quando se tratavam de faltas de serviços já anteriormente existentes e como tal era necessárias resolvê-las com alguma urgência, outras tinham um carácter acentuadamente regionalista, o fundamento do progresso e desenvolvimento, que só a descentralização poderia fazer, como se poder ler na seguinte reflexão:
O que é a descentralização?
É a simplificação em todos os rumos da administração pública.
É a igualdade de direitos entre a capital e as províncias
É a abolição total dos vínculos.
É melhorar por todos os modos a instrução pública, derramando-a até ao último casal.
É a formação de bancos crédito para favorecer a agricultura
É a divisão territorial, para que não aniquile a vida dos povos.
É a repressão da emigração.
Aliás, os colaboradores e redactores tinham a consciência de que a imprensa era decisiva para o progresso das populações: “O auxílio da imprensa não é tanto para desprezar como a muitos se afigura. Nele se discutem os assuntos mais vitais da localidade, os melhoramentos mais urgentes; e muitas vezes os povos abraçam, depois de discutidos e pausadamente avaliados, projectos importantes, que o mais ousado vereador se não atreveria a apresentar”. Mas a luta política pela influência na vida local com base nas reivindicações locais, praticamente não ocupava espaço nos periódicos locais antes da década de 1870 e quando tal se verificava, a razão era normalmente as eleições municipais. Todavia os conceitos políticos emergentes das sociedades liberais eram motivo de reflexões de natureza pedagógica com alguma normalidade na imprensa periódica oitocentista: “ A Democracia na actualidade, não é somente uma ardente aspiração. É a expressão do d´este século – é o credo da humanidade. Falamos (…) da democracia que menciona, envageliza, que instrui, que repreende com benevolência, que a mina com o exemplo, que fortalece com a doutrina, e que espera impassível e perseverante, com a religião, e com a liberdade. A democracia assim é liberdade, a igualdade e a fraternidade”.Mas seria na década de 1880 que os periódicos elvenses se afirmavam como meios de intervenção política, de forma prática e objectiva, nas questões de matriz nacional ou local, de facto O Elvense acabou por se tornar numa verdadeira baluarte dos interesses do Partido Progressista, enquanto que o Correio de Elvas afirmou-se como o órgão oficial do Centro Republicano Elvense, contribuindo para a intensificação da propaganda republicana. Todavia se algumas folhas de Elvas, questionavam ou defendiam o sistema republicano através da crítica violenta ao regime monárquico. Outras questões são igualmente objecto de reflexão nos jornais do fim do século, como sejam a validade do sistema parlamentar assente no rotativismo: “Ao fim de meio século de representação nacional, estamos cada vez peior em matéria de regime representativo. Temos a certeza que os progressistas não romperão todas as dificuldades para colocarem o systema político na altura que lhe pertence.” As críticas à acção ao governo e a validade da acção política dos partidos, eram outros dois temas predilectos das folhas liberais oitocentistas. Postado por Arlindo Sena