Na continuidade da nossa reflexão sobre a demografia da modernidade, terminamos hoje, a análise sobre os dados relativos ao período da Monarquia absoluta, que apresenta as mesmas dificuldades para a época medieval, uma vez que a estatística enquanto instrumento do poder político é uma realidade do Estado Liberal. Assim o tratamento dos dados demográficos continua a ter uma forte componente local e determinada pelos registos paroquiais. Todavia a cidade de Elvas, a partir de meados do séc. XVII ganhava um nova dimensão do ponto de vista administrativo e político, estava muito longe da organização municipal que marcara a vida política e institucional nas últimas décadas do século XVI, tinha crescido em termos de efectivos relativamente à época de Quinhentos mas era agora uma cidade fortalecida pela sua dimensão militarizada e eclesiástica, de facto o tempo dos alcaides mores tinha acabado e a nova autoridade política e institucional era exercida por uma nova personagem o Governo da Praça, que traria ao longo da segunda metade do séc. XVIII, alguns filhos segundos da nobreza titulada de Portugal para direcção dos destinos de Elvas. No tempo em que muitos elvenses de todos os estados sociais circulavam pelas terras do império colonial português e depois Ibérico, na qual a diocese de Elvas se destacava das restantes nacionais, uma vez que era o único Bispado com jurisdição em terras coloniais. Não podemos ignorar que a constituição do Bispado de Elvas se justificou como forma de integrar a população de Ceuta espiritualmente, de resto, a única razão para a sua existência e posteriormente desaparecimento, pois tratava-se de uma circunscrição jurídica artificial. Todavia o crescimento populacional até meados do séc. XVII não acompanhou a realidade nacional, numa época em que as estimativas para a população portuguesa são variáveis segundo as propostas de vários historiadores que revelam valores que variam entre 1.3 e 2 milhões de habitantes, mas que demonstram uma expansão demográfica inquestionável. Em Elvas, ao longo do século XVII a população apresenta uma irregularidade permanente, assim se considerarmos, o cronista da época João Casão a população elvense no início da década de 1570 aproximava-se dos 3.500 vizinhos, em números efectivos, estaríamos a falar de população de cerca de 14.000 habitantes. Que nos permite outra conclusão interessante do ponto de vista histórico, a mudança do comportamento da população elvense, que se desloca do espaço rural para a nova cidade ao longo da sua metade do séc. XVII. De facto em 1573, segundo a contagem de fogos mandada fazer pelo monarca, D. João III, o número de vizinhos não ultrapassava os 1.916 vizinhos ou seja a população da cidade cresceu mais de 50% em meio século, uma realidade impossível de ter credibilidade considerando, as vagas epidémicas e os episódios de cercos e de guerra, que marcaram essa época, mesmo considerando que a cidade era a uma porta aberta para a Europa, mas isolada no contexto regional pelos caminhos e pelos incentivos económicos, um monopólio da “classe mercantil” em grande parte na posse dos cristãos novos de Elvas e Badajoz, os primeiros de resto já tinham casas de morada na Rua dos Mercadores na capital portuguesa e alguns deles estavam já envolvidos no tráfico internacional. O que se verifica na prática é que o número de vizinhos do concelho de Elvas em 1573 na sua totalidade situava-se em 2.354 vizinhos incluindo as zonas rurais o que significa que uma parte da população rural se fixou na cidade e se houve crescimento demográfico foi relativo e não expansivo que é uma realidade da demografia contemporânea. Todavia os números de Rui Casão são discutíveis considerando que o cronista elvense, Aires Varela que afirma que no início da Guerra da Restauração, a cintura da muralha de Elvas era capaz de proteger 3.000 vizinhos e esta afirmação é incontestável, uma vez que a descrição dos aglomerados populacionais do Bispado feita por António Novais refere 2.500 vizinhos. Numa análise documental com base nos registos de baptismos entre 1532 e 1660, nas freguesias mais representativas (Sé, S. Salvador, Alcáçova e São Pedro), verificamos que a partir de 1612 o seu número decresce em 50 % e é uma tendência que marcou o comportamento demográfico da população local desde meados do séc. XVI. O número de casamentos também apresenta o mesmo comportamento com taxas menos expressivas, mas com quedas médias de 8% a partir do início do séc. XVII. As taxas de mortalidade disparam na ordem dos 50% entre finais do século XVI e só na década de 1630 recuperam a normalidade. Ou seja, a caminho do século XVIII a cidade está em plena recuperação demográfica, a população civil chegava aos 10.000 habitantes, mas a cidade era também um espaço de aquartelamento temporário e permanente quando a conjuntura europeia ameaçava os interesses nacionais, em meados do século iniciava-se o processo de militarização da praça com a presença constante de efectivos militares a população chegava aos 17.000 efectivos e atinge o seu máximo temporariamente nas vésperas das Guerras Peninsulares, quando um contingente militar de 31.200 efectivos se concentrou na cidade de Elvas. Assim a época de Setecentos foi caracterizada pelo regresso de alguns funcionários régios, clérigos e outros que serviram o Império Espanhol, foi o tempo de sarar as feridas abertas pelas guerras da Restauração, as mortes geradas pelos surtos epidémicos e voltar em busca da prosperidade do solo elvense, ainda ao abandono, com áreas de mata e floresta, que se prolongará por mais de um século e meio, na cidade dos olivais que circunda o perímetro urbano e fortificado. Mas apesar de tudo a cidade de Elvas, recuperou parte da sua população e quando se chegava aos fins do séc. XVIII o seu número de fogos ultrapassa os 2.500 de vizinhos, um pouco mais do número de efectivos populacionais existentes em meados do séc. XVII sendo de longe a área com mais concentração de habitantes em todo o Alentejo, mais de 30 habitantes por Km2 segundo o Doutor António Hespanha. Em termos de prestígio institucional e político, a cidade de Elvas atingia o primeiro Banco das Cortes desde 1641, onde estavam sentados os procuradores de Lisboa, Porto, Coimbra, Évora e Santarém, os efectivos populacionais continuavam a ser decisivos para a elaboração do plano das Cortes, mas a chegada da Nobreza funcionalista de algumas casas aristocráticas portuguesas a categoria de Governadores da Praça Militar de Elvas do Forte da Graça, na centúria seguinte e o currículo dos Bispos de Elvas, alguns com passagem no Tribunal da Inquisição e nas principais dioceses do Império Colonial tornavam a cidade um espaço de referencia do estado moderno, absoluto e burocrático.(CONTINUA).